terça-feira, 26 de julho de 2011

Máscaras, Jung, Bergman, Godard e de como eu adoro cinema acima de tudo na vida...


Eu compreendo, tudo bem: o desesperado sonho do ser, não parecer, mas sim ser. Em todos os momentos, alerta à distância entre o que tu és com outros e o que tu és para ti. A vertigem e a constante fome de ser exposta, ser vista através de, talvez até ser apagada. Em cada gesto uma mentira, em cada sorriso uma máscara. Suicídio? Não, muito vulgar. Mas podes-te recusar a mexer, recusar a falar de modo a que não precises de mentir. Podes-te calar em ti própria. Assim não precisas de interpretar papéis ou fazer gestos errados. Ou pensas tu. Mas a realidade é diabólica. O teu esconderijo não é impermeável. A vida engana-te e tu és forçada a reagir. Ninguém te pergunta se é verdadeiro ou falso, se estás a ser autêntica ou apenas uma cópia. Coisas como estas só têm importância nos palcos, e até mesmo lá raramente têm. Eu compreendo porque não falas, porque não te mexes, porque estás apática. Compreendo. E admiro. Deves desempenhar este papel até ao fim até que perca o interesse para ti. Depois podes abandoná-lo, assim como abandonaste todos os outros papéis, um por um.
Margaretha Krook em Persona de Ingmar Bergman (1966)


Jean Luc Godard escreveu na revista Cahiers du Cinema que “se para Bergman estar só é fazer perguntas, para Bergman filmar é encontrar as respostas”. O texto acima transcrito é um excerto de Persona, filme escrito e realizado por Ingmar Bergman e uma chave mestra na sua obra individual. Aparentemente um monólogo, este é um diálogo entre a psiquiatra interpretada por Margaretha Krook e a sua doente, a personagem Elisabeth Vogler interpretada por Liv Ullmann. Enquanto que as palavras faladas pertencem unicamente à primeira, a segunda responde com olhares e silêncios, olhares que falam, silêncios que gritam. O filme trata o período de exclusão de Vogler, uma actriz constantemente a representar. Sendo incapaz de fazer cair as várias máscaras que carrega, deixa que a enfermeira que a acompanha, personagem interpretada por Bibi Andersson, sugue a sua própria personalidade apropriando-se da sua vida. A actriz, que mais nada sabe fazer do que actuar, toma assim a identidade da ingénua enfermeira num debate interior pela sua genuinidade.

The cinema is truth 24 frames-per-second. -Jean-Luc Godard


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