quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sobre sombras, contrastes e novamente cinema.


Tem me apetecido escrever sobre cinema. Escrever até me fartar se é que isso é possivel. Tenho fome de bons filmes, de análises críticas, de debates enfáticos. E esta vontade não me vem apenas do rígido mestrado em estudos cinematográficos em Inglaterra. Como já aqui falei desde cedo no meu curso de comunicação o cinema assumiu uma importância fulcral e sempre me servi dele como auxiliar de tantas e tantas teorias da comunicação. Dá-me gozo, é isso. Dá-me muito gozo. Análises semióticas chatas que não interessam ao Menino Jesus mas que a mim fazem vibrar. E daí mais uma vez aqui estou com o cinema, "o meu cinema".

Quando disse ao meu orientador que queria fazer uma tese sobre "O Sonho e o Cinema" ele disse-me que a minha escolha era atrevida. A minha ignorância poder-se-ia pagar cara. Há pouca bibliografia sobre o tema, caminhava sobre terrenos escorregadios e não podia contornar a abordagem à psicanálise. Assim foi e resultado melhor seria impossivel. O meu case-study foi o filme Mulholland Drive de Lynch, filme esse que nomeio como um dos melhores que tive o prazer de assistir (dezenas de vezes). Talvez seja interessante que partilhe algumas observações sobre a complexa obra aqui, uma vez que o número de pessoas que já me pediu uma desconstrução do filme seja considerável. Para já e tal como ontem pegando numa citação constituinte da minha tese aqui fica este texto que acho absolutamente fabuloso.

John Alton, director de fotografia de mais de cem filmes falou muitas vezes do poder da luz e da falta dela. Das sombras e dos contrastes e de como a iluminação é sem dúvida o mais importante na fotografia de um filme. Amante que sou desta vertente do cinema aqui fica este descontraído texto que se lê num arder de um fósforo e que mais uma vez me faz pensar não há nada mais mágico que a ficção, nomeadamente em cinema.


“Para se aperceber do poder da luz e do que ela pode fazer à mente de uma audiência, visualize esta pequena cena: O quarto está escuro. Um forte raio de luz aparece no hall sobre a porta. Ouve-se o som de passos. A sombra de dois pés divide o raio de luz. Segue-se um breve silêncio. Existe suspense no ar. O que é? O que vai acontecer? Ele vai tocar à campainha? Ou apenas inserir a chave e tentar entrar? Aparece outra sombra mais pesada que bloqueia a luz por completo. Ouve-se um indistinto som de assobio e a sombra vai-se embora. Vemos com a luz fraca, um papel a ser empurrado sobre a carpete. Ouvem-se novamente os passos… Desta vez a irem-se embora. Aparece uma vez mais uma luz que ilumina a nota de papel no chão. Lemo-la à medida que os passos se afastam: São dez horas. Por favor apague o seu rádio. O vizinho.”

Painting with Light (1949)


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